A Responsabilidade Civil e os tipos de Instituição Financeira nos Contratos de Compra e Venda


O contrato de compra e venda é celebrado entre a agência de automóveis e o consumidor, a Financeira concede o crédito e obtém o veículo como garantia.

Formam-se, portanto, 02 (dois) contratos: um de compra e venda, outro de financiamento que tem o contrato de alienação fiduciária como acessório.

Durante muito tempo a jurisprudência do TJ/RJ esposou o entendimento no sentido de que eventual problema com o veículo adquirido por meio de contrato de financiamento, parcial ou total, a instituição financeira também era solidariamente responsável pela qualidade ou vício do produto.

Não se fazia qualquer distinção entre o denominado “banco de varejo” e o “agente financeiro da montadora do veículo“, que fornece linha de crédito exclusiva para a aquisição de veículos de sua marca em virtude da interpretação mais abrangente dos dispositivos do Código de Defesa do Consumidor.

O código consagrou a responsabilidade civil do fornecedor de produtos e serviços pela reparação dos danos causados aos consumidores pelos fatos ou vícios de produtos ou de serviços (artigos 12, 14, 18 e 20), independentemente da existência de culpa, desconsiderando, no campo probatório, quaisquer investigações relacionadas à conduta do fornecedor.

Entretanto, recentemente o TJ/RJ começou a rever esse entendimento para adotar uma posição mais restritiva quanto a responsabilidade da instituição financeira que não tem vínculo com a montadora.

A propósito essa é a posição a qual me filio por entender ser mais justa, atender a mens legis, limitar a responsabilidade das partes envolvidas, sob pena de se criar uma “cadeia infinita” de pessoas jurídicas responsáveis por um único negócio jurídico (compra e venda) e proteger a segurança jurídica.

A responsabilidade por eventuais problemas ocorridos com o veículo será da concessionária ou da montadora, quando se tratar de “banco de varejo”.

Pelo entendimento mais recente, a responsabilidade pela qualidade do produto ou vício somente alcançará o agente financeiro com vínculo com a montadora.

O “banco da montadora” trata-se de parceiro comercial exclusivo para incrementar as vendas dos veículos da marca, portanto, pertence a cadeia de serviço.

O serviço prestado pelo denominado “banco de varejo” restringe-se ao fornecimento ode crédito (mútuo) para a aquisição de bem.

Esse também é o entendimento esposado pelo Superior Tribunal de Justiça. Neste sentido.

Ementa. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CANCELAMENTO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE VEÍCULO COM A REVENDEDORA. RESCISÃO DO CONTRATO DE FINANCIAMENTO E RESTITUIÇÃO DOS VALORES PAGOS COM A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. INEXISTÊNCIA DE ACESSORIEDADE ENTRE OS CONTRATOS. MANUTENÇÃO. PRECEDENTES. AGRAVO IMPROVIDO. 1. O cancelamento de contrato de compra e venda de veículo com a revendedora não se estende ao contrato de financiamento estabelecido com a instituição financeira, tendo em vista que a jurisprudência desta Corte entende não haver relação de acessoriedade entre o contrato de compra e venda de bem de consumo e o de financiamento bancário com alienação fiduciária destinado a viabilizar a aquisição. 2. Ressalte-se que esse entendimento difere dos casos em que a instituição financeira for vinculada diretamente à concessionária do veículo ("banco da montadora"), por ser parte integrante da cadeia de consumo. 3. No caso, não se trata de revisão de matéria fático-probatória, mas tão somente da aplicação da jurisprudência consolidada pelo Superior Tribunal de Justiça ao caso concreto, conforme se extrai dos precedentes apresentados. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.”

(AgRg no AREsp 688771 / RJ AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2015/0072914-4 - Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE - TERCEIRA TURMA - DJe 03/02/2016), grifamos.
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Ementa. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DECISÃO RECORRIDA PUBLICADA NA VIGÊNCIA DO CPC/1973. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE VEÍCULO E CONTRATO DE FINANCIAMENTO. VÍCIO DO PRODUTO. INEXISTÊNCIA DE ACESSORIEDADE ENTRE OS CONTRATOS. PARTE BENEFICIÁRIA DA GRATUIDADE JUDICIÁRIA. CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CABIMENTO. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO PAGAMENTO. DECISÃO MANTIDA.

1.Consoante jurisprudência desta Corte não há relação de acessoriedade entre o contrato de compra e venda de bem de consumo e o de financiamento bancário com alienação fiduciária destinado a viabilizar a aquisição, haja vista a autonomia dos negócios jurídicos realizados. Precedentes. (...)”.

(AgRg no Resp. 1252879 / RJ AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL 2011/0098798-4 - Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA - QUARTA TURMA - DJe 09/06/2016), grifamos.
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Ementa. DIREITO CIVIL. CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE VEÍCULO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. CONTRATO ACESSÓRIO. CÓDIGO DE DEFESA DO COSUMIDOR. DEFEITO NO PRODUTO. RESPONSABILIDADE DO FORNECEDOR. 1. O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras (Súmula n. 297), mas apenas em relação aos serviços atinentes à atividade bancária. Por certo que o banco não está obrigado a responder por defeito de produto que não forneceu tão-somente porque o consumidor adquiriuo com valores obtidos por meio de financiamento bancário. Se o banco fornece dinheiro, o consumidor é livre para escolher o produto que lhe aprouver. No caso de o bem apresentar defeito, o comprador ainda continua devedor da instituição financeira. 2. Não há relação de acessoriedade entre o contrato de compra e venda de bem de consumo e o de financiamento que propicia numerário ao consumidor para aquisição de bem que, pelo registro do contrato de alienação fiduciária, tem sua propriedade transferida para o credor. 3. Recurso especial conhecido e provido. ”.

(REsp 1014547 – Relator Ministro João Otávio de Noronha – Julgado em 25/08/2009 – Publicado em 07/12/2009), grifamos.

Note que, ainda que o bem apresente vício, o consumidor continua obrigado a honrar com o contrato de financiamento.

A interrupção do pagamento do contrato de financiamento deve ser precedida de decisão judicial, sob pena do consumidor cometer abuso de direito e a busca e apreensão do bem.

Quanto ao dano moral, a jurisprudência do TJ/RJ entende que nesses casos não há que se falar em responsabilidade da instituição financeira (banco de varejo) por eventual transtorno decorrente da qualidade ou vício do bem adquirido.

Atente-se que esse entendimento não é majoritário no TJ/RJ, sendo possível encontrar muitas decisões, em 1ª e 2ª instâncias, que reconhecem a responsabilidade civil tanto do “banco de varejo”, quanto do “banco da montadora” pela qualidade do bem adquirido e o dever de indenizar por danos morais.

Bibliografia: jurisprudência do TJ/RJ e do STJ.


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