A RESPONSABILIDADE CIVIL DOS HOSPITAIS


Outra questão que passou por uma mudança de entendimento da jurisprudência do TJ/RJ é com relação à responsabilidade civil dos hospitais quando reconhecido o erro médico.

O presente artigo não tem como objetivo analisar a conduta do médico isoladamente, mas inseri-la dentro do contexto de forma que seja possível entender a matéria do ponto de vista da responsabilidade do nosocômio.

Inicialmente, destacamos algumas questões comuns ao tema, como por exemplo, quanto a responsabilidade subjetiva do médico que possui obrigação de meio e não de resultado (§4º, do artigo 14, do CDC e artigo 186, do Código Civil), exceto no caso do cirurgião plástico.

Para o doutrinador HUMBERTO THEODORO JÚNIOR na obrigação de meio, “o que o contrato impõe ao devedor é apenas a realização de certa atividade, rumo a um fim, mas sem ter o compromisso de atingi-lo”. (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Dano Moral. 4ª ed. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2001, p. 69).

FABRÍCIO ZAMPROGNA MATIELO: obrigação de meio é a que vincula o profissional à aplicação diligente de todos os recursos disponíveis para a melhor condução possível do caso clínico que será alvo de seus préstimos. O médico não fica adstrito a um resultado final, mas tem de envidar todos os esforços e utilizar-se dos aparatos técnicos que estiverem razoavelmente ao seu alcance. A cura do paciente não é, certamente, o objetivo jurídico da contratação, embora se coloque como finalidade primacial do atendimento prestado, mesmo porque a reação dos pacientes é particular ante tratamentos estritamente iguais; o que para um representa a cura, para outro nada resolve. MATIELO, Fabrício Zamprogna. Responsabilidade Civil do Médico. Porto Alegre: Sagra Luzzatto, 1998, p. 53.

Cabe destacar que a culpa deve ser entendida lato sensu, abrangendo o dolo (intenção do médico em causar algum dano ao paciente) e a culpa stricto sensu, com suas várias modalidades: imperícia, imprudência e negligência. A propósito, o Código de Ética Médica dispõe no artigo 29 que é vedado ao médico “praticar atos profissionais danosos ao paciente, que possam ser caracterizados como imperícia, imprudência ou negligência”.

Ressalte-se a importância da produção de prova pericial médica na fase de instrução do processo para avaliar a conduta do médico, se culposa ou não e a correção na escolha do procedimento/tratamento.

Também não há discussão sobre a responsabilidade civil objetiva do Plano de Saúde na culpa in elegendo, na escolha do profissional que tem reconhecida a sua culpa (imperícia, imprudência e negligência), baseado no fato de que foi quem credenciou e/ou associou.

Já no caso do serviço prestado pelo nosocômio , que é o principal objeto de análise neste artigo, temos uma divisão em 03 (três) situações que influenciarão na sua responsabilidade civil.

O tema já se revela maduro pela dicção do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1145728 MG 2009/0118263-2), ao disciplinar que a responsabilidade dos nosocômios por dano causado ao paciente-consumidor: (a) as obrigações assumidas diretamente pelo complexo hospitalar limitam-se ao fornecimento de recursos materiais e humanos auxiliares adequados à prestação dos serviços médicos e à supervisão do paciente, hipótese em que a responsabilidade objetiva da instituição (por ato próprio) exsurge somente em decorrência de defeito no serviço prestado (art. 14, caput, do CDC); (b) os atos técnicos praticados pelos médicos sem vínculo de emprego ou subordinação com o hospital são imputados ao profissional pessoalmente, eximindo-se a entidade hospitalar de qualquer responsabilidade (art. 14, § 4, do CDC), se não concorreu para a ocorrência do dano; (c) quanto aos atos técnicos praticados de forma defeituosa pelos profissionais da saúde vinculados de alguma forma ao hospital, respondem solidariamente a instituição hospitalar e o profissional responsável, apurada a sua culpa profissional

Sobre o tema temos a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

Ementa. CIVIL. AÇÃO DE COMPENSAÇÃO POR DANO MORAL. ERRO PRATICADO POR MÉDICO NÃO CONTRATADO PELO HOSPITAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ATRIBUIÇÃO AFETA EXCLUSIVAMENTE AO HOSPITAL. AUSÊNCIA DE NEXO CAUSAL ENTRE O DANO MORAL E A CONDUTA INERENTE AO TRATAMENTO HOSPITALAR. 1. Ação de compensação por dano moral ajuizada em 04.03.2002. Agravo em Recurso especial concluso ao gabinete em 22.09.2016. 2. Cinge-se a controvérsia a definir se o recorrente possui responsabilidade civil por erro médico cometido por profissional que não possui vínculo com o hospital, mas utiliza as dependências do estabelecimento para a realização de internação e exames. 3. Por ocasião do julgamento do REsp 908.359/SC, a Segunda Seção do STJ afastou a responsabilidade objetiva dos hospitais pela prestação de serviços defeituosos realizados por profissionais que nele atuam sem vínculo de emprego ou subordinação. Precedentes. 4. A responsabilidade do hospital somente tem espaço quando o dano decorrer de falha de serviços cuja atribuição é afeta única e exclusivamente à instituição de saúde. 5. Quando a falha técnica é restrita ao profissional médico sem vínculo com o hospital, não cabe atribuir ao nosocômio a obrigação de indenizar. 6. Recurso especial conhecido e provido.”

(REsp 1635560/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 10/11/2016, DJe 14/11/2016), grifamos.

Nas hipóteses em que o médico atua como preposto, o STJ, antes divergente, passou a acenar no sentido de que a responsabilidade do estabelecimento é objetiva, exceto quando o médico não atua como preposto, mas apenas utiliza as instalações e equipamentos da clínica ou hospital (denominado de "serviço de hotelaria"), a exemplo do aluguel de centro cirúrgico.

Ementa. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ERRO DE MÉDICO. RESPONSABILIDADE DO HOSPITAL. DANO MORAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. ART. 535 DO CPC. ESTADO DO RIO DE JANEIRO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO VIGÉSIMA TERCEIRA CÂMARA CÍVEL Apelação Cível nº 0029148-29.2015.8.19.0001 (THA) NÃO OCORRÊNCIA. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. VALOR DA INDENIZAÇÃO. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA Nº 7/STJ. 1. Não há falar em negativa de prestação jurisdicional se o tribunal de origem motiva adequadamente sua decisão, solucionando a controvérsia com a aplicação do direito que entende cabível à hipótese, apenas não no sentido pretendido pela parte. 2. Consoante precedentes desta Corte, o hospital tem responsabilidade objetiva por erro de médico integrante de seu corpo clínico. 3. A reforma do julgado a respeito da configuração do dano moral e do valor arbitrado a título de indenização demandaria o reexame do contexto fático-probatório, procedimento vedado na estreita via do recurso especial, a teor da Súmula nº 7/STJ. 4. Agravo regimental não provido.”

(AgRg no REsp 1450309 / SP – Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva – j. 11/09/2015), grifamos.

Com relação ao dano moral, o dever de indenizar do hospital somente surge quando comprovada a culpa do médico pelo erro, em se tratando de profissional com vínculo com o nosocômio.

Evidentemente, como pode-se perceber, o tema é bastante complexo envolvendo uma série de condutas, profissionais e empresas que devem ser analisas conforme o caso concreto.



Bibliografia: jurisprudência do TJ/RJ e do STJ.

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